Os milhões do André
Desporto
Publicado em 05/02/2024

Para medir o valor de mercado de um jogador há vários cálculos, fórmulas, estudos, teorias, interesses e até propagandas.

Muito poucas vezes, algum deles, se compatibiliza com o do coração de adepto.
E no caso do meu, o único pelo qual posso responder, a taxa de incompatibilidade rondará, certamente, valores negativos.
Desde logo porque a taxa de câmbio está largamente inflacionada em medidas de valor.
Em alguns casos mais do que em outros, confesso.
Este é um desses casos. André Silva.

O André Silva chegou a Guimarães como o maior negócio/investimento/loucura (cada um leia como entender) da história do Vitória. Milhões nunca antes cedidos e a pressão desconfiada dos economistas de bancada, com valores de referência na conversão sempre mais perto do chão no cash in e do céu no cash out. Inimiga da especulação, mantive-me no meu campo de valor, bola no pé e atitude no terreno, até conseguir dados de avaliação pessoais mais fundamentados, só mais uma entre as mais de trinta e tal mil almas do Rei.

Não demorou muito até chegar às conclusões finais e, de lá até agora, o valor só aumenta.

Saia quando sair, por mais ou menos tostões, a meio ou no final, nenhum valor pagará na totalidade o peso e a diferença que faz nesta equipa de sonhadores determinados, que leva às costas um bocadinho mais do que outros é, no mínimo, justo que se diga.

É por isso que não serve este coração para medir qualidade de negócios com desfechos atribulados, feliz e aliviado por saber da alegria e do descanso que será no relvado, agastado pela necessidade cruel e inevitável da tesouraria.

É que o André é um jogador diferente.

E nem é, em primeiro lugar, pela humildade desconcertante, pelo foco e profissionalismo que faz questão de tornar claramente prioritário.

Nesta sociedade de Silvas, é o meu tipo de jogador preferido, nem sempre o mais visível, sempre o mais abnegado. Se nos falta nota-se, se notado brilha, invisível cresce a equipa, estende o tapete e abre alas para a glória dos companheiros, visível é recompensado pelo holofote da mestria das decisões.

O valor do André Silva não é mensurável em milhões terrenos porque o seu toque é diferenciado e não há camisola seca ou desonrada que vista, seja no jogo que prende na área, seja no que vai buscar à frente quando é preciso mais pernas na luta. Sabe, quando o companheiro precisa daquela abertura magistral, fazer a bolinha cair-lhe no pé e quando precisa que o adversário prenda nele a atenção, para deixar que outros sigam para o sucesso. Sabe, melhor ainda, aparecer quando ninguém poderia fazer melhor no desfecho decisivo.

O valor da falta do André Silva não será possível igualar. É certo.

Sairá para voar e brilhar, quando assim tiver de ser, deixar-nos só com a nostalgia do “já foi do Vitória” que nos sai orgulhosa e intuitivamente, porque sabe que assim ajudará mais do que em qualquer golo, para garantir que o fará por mais valor do que qualquer golo.

O valor da perda do André Silva, de entre os muitos e grandes que se agigantam, é o maior e o mais difícil de colmatar que hoje temos. E é por isso que o inflacionado coração de adepto não servirá nunca para percentagens nem cifrões.

Nele, eles valem sempre muito mais. Por muito mais.

✍️ Cláudia Bragança 

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