Na Hungria há "reconhecimento" e "respeito" pelo Vitória, diz João Nunes
100 anos: Vitória europeu
Publicado em 19/06/2022

Raquel F. Veiga

 

Depois de um hiato de dois anos das competições europeias - a participação na fase de grupos da Europa League em 2019/2020 é a última -, os conquistadores voltam a ser anfitriões de clubes europeus e a viajar para viver noites europeias à boleia da UEFA Conference League no ano do centenário. O Vitória Sport Clube vai encontrar, na segunda pré-eliminatória da prova, os húngaros da Puskás Akadémia FC, equipa que acolheu o português João Nunes nas duas últimas temporadas. O Estádio D. Afonso Henriques recebe o primeiro jogo no dia 21 de julho. Os conquistadores viajam depois para a Hungria. O jogo da segunda mão da eliminatória está marcado para o dia 28 de julho. A Rádio Inquieta vai acompanhar a epopeia do Vitória SC pela Europa nas noites em que o futebol é pretexto para estudar geografia, geopolítica e história. Esta reportagem, que tem como mote uma conversa com João Nunes, o primeiro e por enquanto único português que representou o clube de Felcsút, é a reportagem inaugural de uma série dedicada à participação do Vitória SC na UEFA Conference League no ano em que a instituição completa 100 anos de existência.

 

É dentro da pequena área que João Nunes gosta de marcar. O central português, com quase 1,90 m de altura, está habituado a saltar mais do que os outros e, não raras vezes, a cabecear para o fundo das redes adversárias. Foi assim, sempre na sequência da cobrança de um pontapé de canto, que marcou com a camisola do Puskás Akadémia FC na última temporada: a primeira vítima foi o Újpest FC logo na primeira jornada da OTP Bank Liga, o principal campeonato da Hungria; depois foi o Ferencváros, clube que domina o país e que se sagrou tetracampeão, para carimbar um triunfo pela margem mínima e deixar o Puskás Akadémia FC a apenas quatro pontos do primeiro lugar; e por fim o Paksi. João Nunes repetiu a mesma fórmula nas três ocasiões e em três jogos que culminaram em três triunfos: contas feitas, os golos do português contribuíram para a conquista do terceiro lugar no campeonato e de uma vaga europeia que põe os húngaros no caminho do Vitória SC.

O primeiro – e para já único – jogador luso a representar os azuis de Felcsút termina a ligação contratual com o clube húngaro a 30 de junho, depois de duas épocas desportivas e seis golos apontados em 50 jogos, mas antes esteve à conversa com a Rádio Inquieta a propósito do sorteio da 2.ª pré-eliminatória da UEFA Europa Conference League que emparelhou o Vitória Sport Clube com o Puskás Ferenc Labdarúgó Akadémia ou, como é conhecido, o Puskás Akadémia FC. O setubalense formado no SL Benfica, que está fora do país desde 2016 – representou o Lechia Gdansk e o Panathinaikos antes de se mudar para a Hungria –, disse à Rádio Inquieta que, assim que os antigos colegas de equipa conheceram o adversário da segunda pré-eliminatória, lhe mandaram imediatamente mensagem para saber o que esperar e que conseguiu entender é que há “o reconhecimento de que o Vitória é um grande clube”, mas alerta: “vejo também uma vontade muito grande de abordar este jogo porque é uma oportunidade para se mostrarem contra uma equipa e um clube tão grande como é o Vitória”.

João Nunes começa por confirmar o que está à vista de todos: “a Hungria está a crescer muito no futebol, em parte fruto do investimento que tem sido feito para que os clubes se desenvolvam, para que haja melhores condições para atrair outros jogadores”. A seleção húngara, que recentemente aplicou aos ingleses a pior derrota em casa desde 1928, serve de prova. Zsolt Nagy, um dos marcadores que contribuiu para a goleada por 0-4 em solo britânico, é colega de equipa – e de setor – do português no Puskás Akadémia FC e é um produto da formação do clube. No entanto, e apesar do crescimento acentuado, João Nunes assinala com facilidade as diferenças do futebol húngaro com o futebol da sua terra natal: “o futebol português é um futebol mais tático, mais pensado, mais detalhado em cada pormenor”. Enquanto isso, diz, na Hungria “há situações e momentos em que o jogo é muito rápido”. Depois de dois anos mergulhado no futebol húngaro, as explicações estão na ponta da língua. “É uma transição ofensiva, a seguir uma transição defensiva e logo a seguir outra vez uma transição ofensiva. Há momentos em que não há de facto essa pausa para dizer: «ok, ganhamos a bola, vamos parar, vamos pausar o jogo»”, diz.

Os comandados de Pepa já não vão encontrar João Nunes no eixo defensivo dos húngaros. O contrato do português expira a 30 de junho, mas não se esconde a perspetivar o jogo e acredita que “vai ser interessante ver o que a componente física trará ao jogo”. A partida inaugural, agendada para o dia 21 de julho no Estádio D. Afonso Henriques, vai ser o primeiro jogo oficial da temporada para as duas formações. “Antes disso serão apenas jogos amigáveis, jogos de treino, que dão muita coisa, mas não são iguais a um jogo oficial”, afirma o central. Ver que as duas turmas se vão encontrar “no momento muito específico que é o início da época” é, entende João Nunes, um condimento que pode tornar o jogo ainda mais interessante. O jogador descreve a formação do Puskás Akadémia FC como “uma equipa que está confortável num bloco médio, à espera que a bola entre em determinadas zonas para exercer pressão e depois explorar os espaços que a equipa adversária deixa”. E isto não deverá mudar na próxima época. “O treinador fará algumas alterações ao estilo de jogo consoante os jogadores que forem entrando”, diz antes de acrescentar que, mesmo assim, acredita “que passará muito pelas mesmas ideias”.

João Nunes sabe do que fala. O eslovaco Zslot Hornyák chegou ao clube húngaro em 2019/2020, uma época antes do português, e desde que assumiu o comando técnico do clube não alcançou uma classificação fora do pódio: em oito participações na primeira divisão – e nove épocas de futebol sénior de competição –, o Puskás Akadémia FC alcançou o 3.º lugar em 2019/2020, o 2.º lugar em 2020/2021 e, por fim, o 3.º lugar na última temporada. Isto traduziu-se, em termos práticos, em três aventuras europeias: a fase de qualificação da Europa League e, por duas vezes - a contar já com a próxima temporada -, a fase de qualificação da UEFA Conference League. O jogador descreve o treinador como “uma pessoa que tem ideias muito fixas” e entende que estabilidade na liderança técnica do clube é uma vantagem: “o core do grupo sabe perfeitamente aquilo que o treinador quer e penso que isso facilita o processo de adaptação para os que chegam, as ideias de jogo acabam por ser mais claras para toda a equipa”.

Em vez de destacar nomes do coletivo, João Nunes acredita que há algumas situações, mais do que jogadores, que merecem a atenção particular de Pepa: “a velocidade dos jogadores nas alas é um fator muito importante e essa organização e essa paciência de estar num bloco médio para aproveitar o erro também”. E acrescenta em tom de alerta que “se o adversário adormece e comete um erro, há espaços que vão ser explorados”. Resume, por fim, que o que pode decidir a partida, da perspetiva do Puskás Akadémia FC, é “o explorar de espaço nas costas com a velocidade dos jogadores dos corredores”.

As conversas que teve com os antigos colegas de balneário logo depois do sorteio que ditou os vitorianos como adversários permitiram perceber a reação da maioria: “nota-se que há respeito e nota-se que há aquela reação de: «vou jogar com o Vitória», mas essa reação é acompanhada com entusiasmo, não com receio, mas um entusiasmo de ser uma oportunidade e um excelente jogo para se jogar”. A reação na Hungria e pelos corredores do clube foi, diz, de “reconhecimento” e de “respeito”. A conversa fluí e João Nunes elabora: “o que eu vejo é, de facto, o reconhecimento de que o Vitória é um grande clube e há esse respeito pelo Vitória ser um grande clube, mas vejo também uma vontade muito grande de abordar este jogo porque é uma oportunidade para se mostrarem contra uma equipa e um clube tão grande como o Vitória”. A participação intermitente do Vitória nas competições europeias ao longo dos últimos anos perde relevância para a história e para a tradição: perante um clube que começou a jogar futebol há cerca de uma década, vai estar um clube centenário com duas participações na extinta Taça das Cidades com Feiras, 14 participações na Europa League – e uns quartos-de-final pelo meio – e com participações nas fases de qualificação das três provas europeias da atualidade. É uma reação condizente com a do timoneiro Zsolt Hornyák que, depois de conhecido o sorteio, disse que o Vitória era "o adversário mais forte possível".

Apesar de ser um clube jovem, formado já neste milénio, o português releva as “condições de topo” que estão ao nível das condições “de um Sporting, de um Benfica e de um Porto”. O centro de treinos, colado à Pancho Aréna, estádio do Puskás Akadémia FC, “é espetacular” e, diz João Nunes, “o Vitória vai ter oportunidade de ver isso”. Há “dez campos, uns de relva natural e uns de relva sintética” e “um ginásio enorme que tem uma pista de atletismo ao longo de todo o ginásio”, para além de todas as condições médicas à disposição. Provas visíveis do crescimento acentuado dos últimos anos que conduziu o clube às competições europeias e a cruzar caminho com o do Vitória SC. Apesar de tudo – e de “um estádio lindíssimo” com “um relvado em excelentes condições” –, trata-se de “um clube que não tem muitos adeptos pela localização e pela idade”. A marcar presença nas bancadas, para além dos vitorianos e vimaranenses que viajem até à Hungria, provavelmente só vão estar “os locais” e “mais alguns curiosos e entusiastas de futebol”. Se, apesar das diferenças, até se podem traçar paralelismos em algumas coisas, há outras em que as comparações não fazem sentido: “a nível de adeptos obviamente não tem uma massa associativa, nem de perto e nem de longe, daquilo que tem o Vitória”.

Para terminar a conversa, João Nunes deixou conselhos aos viajantes que, no final de julho, vão sair de Guimarães – ou de outros pontos do país e do mundo – com Felcsút como destino final. O primeiro e mais importante é garantir transporte para o jogo. O aeroporto mais próximo do estádio é o de Budapeste e de Budapeste a Felcsút são mais de 45 quilómetros de distância: “é realmente necessário que salvaguardem transporte para chegar ao estádio, é um meio pequeno e distante do centro de Budapeste”. Mas a capital húngara não deve ser apenas ponto de passagem: “é uma cidade lindíssima que tem muito para ver". Imperdível, para o jogador português, é o Cipok a Duna-parton. O memorial Sapatos às Margens do Danúbio "presta homenagem aos judeus que foram perfilados junto ao Danúbio e executados, caindo para o rio".

Depois de um hiato de dois anos das competições europeias - a participação na fase de grupos da Europa League em 2019/2020 é a última -, os conquistadores voltam a ser anfitriões de clubes europeus e a viajar para viver noites europeias à boleia da UEFA Conference League no ano do centenário. O Vitória Sport Clube vai encontrar, na segunda pré-eliminatória da prova, os húngaros da Puskás Akadémia FC, equipa que acolheu o português João Nunes nas duas últimas temporadas. O Estádio D. Afonso Henriques recebe o primeiro jogo no dia 21 de julho. Os conquistadores viajam depois para a Hungria. O jogo da segunda mão da eliminatória está marcado para o dia 28 de julho. A Rádio Inquieta vai acompanhar a epopeia do Vitória SC pela Europa nas noites em que o futebol é pretexto para estudar geografia, geopolítica e história. Esta reportagem, que tem como mote uma conversa com João Nunes, o primeiro e por enquanto único português que representou o clube de Felcsút, é a reportagem inaugural de uma série dedicada à participação do Vitória SC na UEFA Conference League no ano em que a instituição completa 100 anos de existência.

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